Em meados de junho de 1961, a Assembleia Legislativa
do Estado da Guanabara instaurou uma Comissão
Parlamentar de Inquérito para apurar a conivência das autoridades
estaduais com a contravenção do “jogo do bicho”
e a prostituição e era presidida pelo deputado socialista
Gerson Bergher.
Carlos Lacerda, determinado a construir uma rede de
escolas primárias, utilizou a intermediação de uma fundação
pública, a Fundação Otávio Mangabeira, para arrecadar contribuições
em dinheiro, provenientes de particulares, para o
pretendido fim.
A Delegacia de Costumes, dirigida pelo delegado Luís
Alexandre Lafaiete Stockler, apreendeu uma relação de cheques
de banqueiros do “jogo do bicho” doados ao governador
com destino à Fundação. Nas anotações, havia cheques de
José Alves Baião, no valor de Cr$ 250.000,00, Levi Cravo, Cr$
300.000,00, Rafael Palermo, Cr$ 250.000,00, Emílio Vitoriano
de Azevedo, Cr$ 250.000,00, Aristides Malta, 300.000,00 e
Emílio Abade, 500.000,00, todos já investigados pela prática
de delitos. Os cheques eram recebidos por meio de um intermediário
e o Governador os mandava depositar no Banco
do Estado da Guanabara. Tornando-se público o fato, o
Governador negou ter conhecimento, ensaiando reprimir os
doadores, o que não evitou a sua apuração por uma CPI.
Na CPI, foram ouvidos o delegado Stokler, o Chefe de
Polícia coronel Antônio Luís de Barros Nunes, Rafael de
Almeida Magalhães (Chefe de gabinete do Governador),
Raul de Miranda Santos (suspeito de intermediação das doações),
os delegados Galba Bueno Brandão e Iolando Pereira
da Costa, esses últimos, destituídos da titularidade de suas
delegacias por efetuarem a repressão do “jogo do bicho” nas
respectivas circunscrições.
Os trabalhos da CPI apontaram para conclusões como:
a contravenção e o lenocínio deram cheques assinados pelos
próprios delinquentes no valor de cinco milhões e quinhentos
mil cruzeiros à Fundação Otávio Mangabeira; quem recebeu
os cheques foi o próprio Governador no seu gabinete do
Palácio Guanabara; mesmo identificados os bicheiros filantropos
não foram tomadas providências legais contra eles; o
amigo do governador, que intermediava as doações, não foi
responsabilizado; o dinheiro das doações era depositado no
banco do Estado.
Com o golpe militar, poucos meses depois, esses fatos
acabaram sendo diluídos num contexto político ainda favorável
a Lacerda.
A nomeação do jurista e Professor de Direito Hélio
Tornaghi para Chefe de Polícia da Guanabara foi comemorada
pela Imprensa. No dia 17 de agosto de 1961, o “Correio da
Manhã” assinalou a importância do ingresso de um civil no
importante cargo.
“Excetuando-se um período entre 1945 e 1946, não tivemos paisanos
na chefia de Polícia durante muitos decênios. Generais
e coronéis mandaram na Rua da Relação. Foi uma tradição.
Teria sido uma tradição boa?
Não foi boa. Opõe-se a ela, antes de tudo, a nossa tradição
de combater a nomeação de militares para postos civis. Toda
a autoridade é falível porque exercida por homens. Os erros
de militares em postos civis, para os quais nem sempre estão
preparados, prejudicam a boa fama das Forças Armadas. Por
outro lado, os militares, acostumados a serem obedecidos, têm
o hábito de persistirem no erro. Não admitem discussão. Essa
mentalidade tem consequências inconvenientes, sobretudo na
chefia da Polícia de uma grande cidade, posto para o qual a
formação militar não prepara de maneira especial. A polícia
tem tarefas administrativas e jurídicas. Como as encara o militar?
Com espírito de mando. Mas o chefe de Polícia do Rio
de Janeiro não é, nem pode ser o comandante da população
do Rio de Janeiro.
Tivemos, infelizmente, oportunidade de observar o hábito de
tratar a todos como se fossem criminosos, ocorrendo violências
inadmissíveis”
Uma importante iniciativa do novo Chefe de Polícia foi
a criação de uma equipe técnica para comparecer aos locais
de crimes contra a pessoa, procedendo às perícias necessárias
e iniciando as investigações para a sua elucidação.
Após uma reunião com o Diretor de Polícia Técnica,
Diretores do Instituto Médico Legal, Instituto de Criminalística
e o Delegado de Segurança Pessoal, ficou deliberado
que a equipe seria formada por um médico legista, um perito
criminal e por pessoal de investigação.
No Dia do Soldado, 25 de agosto de 1961, o Presidente
da República, Jânio da Silva Quadros renunciou por suposta
falta de apoio parlamentar para dar continuidade ao seu programa
de governo.
Cabia ao Vice-Presidente da República, o Dr. João
Belchior Marques Goulart assumir a chefia da nação. A
frustração dos conservadores, que se alinharam com Jânio
na sua ascensão ao poder, inclusive os partidários da UDN
(União Democrática Nacional), tendo à frente o Governador
Lacerda, militares do grupo do “11 de Novembro”, desarticulados
pelo contra golpe do general Lott para garantir a posse
do Presidente Kubitschek e adversários dos programas de amparo
à classe trabalhadora e de defesa dos interesses nacionais,
defendidos pelo trabalhismo de João Goulart, aproveitando a
ausência deste, durante uma viagem oficial à China, articularam
um golpe de estado para impedir a sua posse. Na liderança
do complô estava uma junta formada pelos Ministros
Militares, Odílio Denys (da Guerra), Sílvio Heck (Marinha) e
Gabriel Grün Moss (Aeronáutica).
Os golpistas não tinham o apoio da totalidade das Forças
Armadas. Diante da resistência armada, iniciada no Rio
Grande do Sul pelo Governador Leonel Brizola com o apoio
do comandante do 3º Exército, general José Machado Lopes,
criou-se um impasse, resolvido após vários dias de tensão e
ameaça de guerra civil, mediante um acordo para a reforma
da Constituição Federal, introduzindo, através de emenda, o
parlamentarismo como sistema de governo.
Nas circunstâncias, o presidente assumiria o governo
com os seus poderes reduzidos e compartilhados com um
Primeiro-Ministro.
O Presidente Goulart tomou posse em 7 de setembro de
1961 e o seu Primeiro-Ministro foi Tancredo Neves. Em janeiro
de 1963, o povo brasileiro, por meio de um plebiscito
devolveu os poderes presidencialistas ao Presidente.
No Estado da Guanabara, enquanto perdurava a crise, o
Governador Carlos Lacerda censurava jornais, prendia adversários
políticos e reprimia manifestações populares como
se o país estivesse sob estado de sítio. Apostava no êxito
dos sediciosos.
Montou, no Departamento Estadual de Segurança
Pública, um esquema militar, chefiado pelo general Sizeno
Sarmento, mantendo esse dispositivo golpista, não obstante,
a posse do Presidente da República. Alijou dos cargos de direção,
por desconfiança, as autoridades civis. Como não poderia
deixar de ocorrer, diante desse quadro de ilegalidades,
afastou-se, da Chefia de Polícia, o Professor Hélio Tornaghi,
um mês após a posse.
Professor Hélio TornaghiDesde o início, o grupo fez grande resistência contra
a nomeação de Tornaghi. O perito criminal aposentado,
Timbaúba da Silva, no seu artigo publicado no “Diário
Carioca” de 28 de setembro de 1961, explica:
“A turma de militares que se apossou de cargos chaves do
DESP e que deles ainda não se afastou, muito embora a taxativa
determinação do governo federal por meio de ordem do
primeiro-Ministro ao titular da Guerra, só tem tido uma preocupação:
desmoralizar o civil e ferir o jurista.
Deixando o DESP, o professor Tornaghi não prejudica o seu passado
e salva o seu presente no conceito dos que o admiram.
Perde o DESP um grande chefe e ganham os inimigos da
Constituição uma grande vitória, o que lhes permitirá continuar
a exercer o seu esquema contra a ordem pública e a democracia
nacional.”
Uma plêiade de Chefes de Polícia se sucedeu no Prédio
Histórico da Rua da Relação no ano de 1962. José de Segadas
Viana, ex-ministro do trabalho, exerceu o cargo por curto
período, afastando-se diante de imputações feitas pelo coronel
Ardovino Barbosa, as quais não foram comprovadas.
O promotor Eugênio Sigaud o substituiu em caráter interino
até a nomeação definitiva do curador Newton Marques
Cruz em abril.
No mês de maio de 1962, dias após a inauguração da
Exposição Soviética da Indústria e Comércio no Rio de Janeiro,
sediada no Pavilhão de São Cristóvão, a polícia encontrou um
potente artefato explosivo com potencial para arrasar o local da
mostra e adjacências. O petardo foi examinado pelos peritos
do Instituto de Criminalística Sérgio Pessoa, Wolmen Joaquim
Lima e Milton Rocha da Silva e considerado apto para alcançar
os resultados lesivos para os quais foi projetado.
O major reformado da Aeronáutica, José Chaves
Lameirão, participante dos acontecimentos de Aragarças,
assumiu a autoria da ação terrorista e envolveu outros indivíduos
do grupo radical de direita “MAC – Movimento
Anticomunista”, liderado pelo almirante Silvio Heck. Contra
ele foi instaurado um inquérito policial militar, obedecendo à
determinação do Ministro da Aeronáutica.
Pela Lei nº 263, de 24/12/1962, foi criada a nova Secretaria
de Segurança Pública do Estado da Guanabara – SSP e definida
a respectiva estrutura.
Substituiu o Departamento Estadual de Segurança
Pública, em funcionamento desde os primeiros dias do nascimento
do estado. Organizou-se nos moldes das estruturas
administrativas das Secretarias de Segurança dos demais estados
da federação.
O coronel aviador Gustavo Eugênio de Oliveira Borges,
antigo diretor do Departamento de Correios e Telégrafos no
governo Jânio Quadros, foi nomeado como o primeiro secretário.
Era amigo de Lacerda e um dos quatro oficiais da FAB
que faziam a sua segurança pessoal na época do atentado da
Rua Tonelero.
A Polícia Civil teve a estrutura esquartejada, seus órgãos
e corporações foram pulverizados no organograma da
secretaria:
• Inspetoria Geral
• Superintendência de Polícia Judiciária
• Departamento de Polícia Distrital – DPD
• Departamento de Polícia Especializada – DPE
• Superintendência Executiva
• Superintendência de Administração e Serviços
• Força Policial
Força Policial, integrada pela Guarda Civil e Polícia de Vigilância• Polícia de Vigilância
• Guarda Civil
• Corpo Marítimo de Salvamento
• Escola de Polícia
A Polícia Militar e o Corpo de Bombeiros, embora subordinados
à SSP, funcionavam como estruturas independentes.
A politicagem de Lacerda e a má vontade de Borges
procuraram desconstruir a Polícia Civil do Estado da
Guanabara, dividindo-a administrativa e operacionalmente,
entregando os seus retalhos aos apaniguados. Os delegados
de polícia foram preteridos nas direções, sempre destinadas
a um militar do esquema golpista do governador ou outro
amigo à espera de colocação.
O desapreço de Borges pelos delegados pode ter surgido
num episódio de 1954, durante a apuração do crime da
Tonelero, quando o aviador, a serviço de Lacerda, na ocasião,
jornalista e dono do jornal “Tribuna da Imprensa”, entrou no
Distrito Policial de Copacabana, onde tramitava o inquérito
e dirigindo-se ao seu delegado titular, dr. Jorge Pastor de
Oliveira, ordenou que o acompanhasse porque o jornalista
queria vê-lo.
Pastor mostrou a impossibilidade de atendê-lo naquele
momento, mas no final do expediente, iria à casa do solicitante.
Borges, sacando de uma pistola, determinou que deveria
obedecê-lo de imediato. Na sala, estava o delegado substituto
Ivan Vasquez e, ao ver a desrespeitosa cena, fez um saque cruzado
dos seus dois revólveres e mandou Borges sair do distrito.
Expulso, engoliu a humilhação no momento, mas não
a esqueceu. Tempos depois, essa figura desajustada se tornou
responsável pela segurança pública dos sofridos cariocas.
Com a criação da Superintendência de Polícia Judiciária
e com o cargo de superintendente vedado aos delegados,
devem ter insistido para o antigo Chefe de Polícia Newton
Marques Cruz assumi-lo. Assim, ele se torna o primeiro
superintendente e permaneceu no cargo até novembro de
1963, sendo substituído pelo promotor Paulo Sales Guerra.
Dois fatos policiais, acompanhados com interesse
pelo público, ocorreram em 1960 e 1961. O primeiro, o assalto
ao trem de pagamentos da Estrada de Ferro Central
do Brasil, em 14 de junho de 1960, em Botais, município de
Vassouras. O crime ficou conhecido como “Assalto ao Trem
Pagador”. Foi executado por Sebastião de Souza, o “Tião
Medonho” e quadrilha, quando roubaram a quantia de dez
milhões de cruzeiros.
Depois de 355 dias do evento, o delegado de Caxias,
Amil Nei Rechaid, responsável pelas investigações, recuperou
os últimos cinco milhões, parte da res furtiva ainda não encontrada,
encerrando com sucesso o caso.
O desaparecimento da tcheca Dana Teffé foi o rumoroso
caso de outubro de 1961. Havia a suspeita do envolvimento
do seu advogado, Leopoldo Heitor, por querer se apoderar
dos bens da sua constituinte. As investigações, também a
cargo do delegado Amil Rechaid, embora não chegassem ao
paradeiro de Dana, reuniram elementos suficientes para uma
primeira condenação de 35 anos de reclusão por homicídio
triplamente qualificado em 1963. Em ambos crimes, o delegado
fluminense contou com a colaboração da polícia carioca.
As questões que afetavam institucionalmente a Polícia
Civil e conduziam ao seu enfraquecimento suscitaram um
clamor de 29 delegados de polícia. Por meio do memorial
de abril de 1962, dirigido ao Poder Legislativo, mostraram
as consequências danosas da administração, incompetente,
irresponsável e imoral do Poder Executivo sobre a atividade
policial no curso dos últimos decênios.
O documento era não só um protesto, expunha a realidade
histórica vivenciada pela instituição. Na prática, não
causou nenhum efeito porque o atendimento das questões
reclamadas dependia de governantes com melhor perfil. Por
representar um marco da luta da classe policial em prol do
aperfeiçoamento e do desejo de bem servir, o memorial é reproduzido
no próximo capítulo.
O funcionalismo público temia o governo de Lacerda,
filiado à União Democrática Nacional, partido político que
sustentava contra ele um discurso demagógico, apontando-o
como uma classe cujo baixo rendimento tornava-a onerosa à
administração pública e até dispensável. Criavam um “bode
expiatório” para confundir o seu eleitorado, fingindo esquecer
o enorme alcance dos serviços mantidos pelo governo em prol
da sociedade em geral e dos mais carentes. O discurso ainda
está presente nas correntes conservadoras quando imputam as
dificuldades financeiras do erário às controladas despesas com
o servidor, omitindo-se diante das enormes verbas desperdiçadas
com gastos irresponsáveis do poder.
Os servidores policiais, transferidos da administração
do antigo Distrito Federal para o Estado da Guanabara, nos
termos da Lei Santiago Dantas, tiveram a investidura federal
mantida pela Comissão de Classificação de Cargos da
Presidência da República em janeiro de 1961. Como servidores
de investidura federal puderam optar por continuar prestando
serviço ao estado ou trabalhar na órbita federal.
Optaram para o serviço público federal 14.902 servidores
e adidos ao Ministério da Justiça passaram a aguardar a
criação da Polícia Federal, quando poderiam ser transferidos
para Brasília. Os servidores optantes da Polícia Civil estavam
sob a direção do comissário de polícia Laudelino Coelho e
foram lotados provisoriamente na SUPRA (Superintendência
da Política Agrária), SUNAB (Superintendência Nacional do
Abastecimento), INTERPOL (Organização Internacional de
Polícia Criminal) e outros órgãos federais.
“O perito Timbaúba da Silva, em seu artigo semanal no
“Diário Carioca”, de 23/04/1964, descreveu a situação da segurança
pública da Guanabara resultante das opções:
“Sem dúvida nenhuma a opção, em favor da União, de algumas
centenas de policiais, de todas as categorias, criou, para a
Guanabara, um problema bem sério que seu governador, em
tempo, não quis ou não pôde solucionar. Em consequência,
o policiamento da cidade, que já era precário, caiu de muito,
ficando a população entregue completamente a sua sorte sem
poder contar com o menor auxílio por parte das autoridades
responsáveis pela segurança pública.”
Prosseguindo, enumerou a deficiência da ação policial
na repressão aos crimes contra a Economia Popular com reais
prejuízos ao povo pelo aumento da ação ilegal dos comerciantes,
com relação aos assaltos que passaram a ocorrer à luz do
dia e em lugares movimentados, sobre o aumento da venda
da maconha, a liberação dos exploradores do lenocínio e das
casas de prostituição etc.
Durante o período de extrema carência de pessoal na
Polícia Civil, o governo valeu-se do efetivo da Polícia de
Vigilância, oriunda da administração municipal e do apoio
dos delegados e comissários de polícia, admitidos nos mais
recentes concursos da Escola de Polícia.
As delegacias foram tomadas por funcionários que,
antes eram vigilantes municipais, pouco letrados, com prática
limitada à proteção de parques e jardins, fiscalização
de camelôs e feiras livres. Substituíram policiais antigos,
experimentados no exercício das atividades de polícia judiciária,
naquele momento, afastados do Estado e lotados
do Ministério da Justiça. Não levou muito tempo para que
surgissem os efeitos indesejados da queda na qualidade dos
serviços e dos deslizes éticos.
Em junho de 1964, uma equipe do detetive João Macedo,
da Divisão de Polícia Política e Social, desmantelou a fortaleza
do banqueiro do “jogo do bicho” Mazinho, na Rua Arquias
Cordeiro no Méier. Foi apreendido em poder do gerente do
contraventor, Luiz Jorge Franco, um caderno com os nomes
de centenas de policiais. Era o chamado “gibi”, relação dos nomes
dos funcionários que recebiam propinas e os respectivos
valores. Outra diligência foi feita por Macedo em Madureira,
na fortaleza do contraventor “Natal, da Portela” ou Natalino
José do Nascimento.
Luiz Franco ainda tentou, mediante a oferta de dez milhões
de cruzeiros, oferecidos ao Detetive Macedo, evitar a
apreensão do “gibi”, mas de nada valeram as suas ofertas e
súplicas.
Uma nota sobre o fato foi distribuída, no dia 23 de junho
de 1964, pela Superintendência de Polícia Judiciária: “No sábado
último, cerca das dezenove horas, o Superintendente de
Polícia Judiciária recebeu comunicação de que fora apresentado,
preso em flagrante, na Delegacia de Costumes, o contraventor
Luiz Jorge Franco, em poder do qual, entre outras coisas,
fora apreendida uma pasta de couro, em cujo interior havia um
caderno com relação de policiais que vinham recebendo propinas
de contraventores do “jogo do bicho”.
Configurando esses fatos, crimes de ação pública, além
de ilícito administrativo, determinou o Superintendente a
instauração de inquérito policial, pelo delegado Raul Lopes
de Faria, da Delegacia de Defraudações, bem como o envio
de cópias das peças ao Secretário de Segurança para
fins administrativos.
O encaminhamento do assunto deveria ficar circunscrito
à esfera estadual com a remessa do inquérito policial à justiça
para o julgamento dos crimes atribuídos aos policiais e contraventores
e à Corregedoria Geral de Polícia, para propor,
diante do exame da conduta de cada um dos envolvidos, o
grau de punição a ser atribuído.
No entanto, o País já se achava em regime de exceção,
decorrente do golpe de estado de 31 de março de 1964. A força
irresistível do poder dos novos senhores dos destinos da
nação fez a investigação do episódio de corrupção localizada
gravitar da mesa do superintendente da S.P.J. para a Comissão
Geral de Investigações, órgão do governo da União sob o comando
do marechal Taurino de Rezende, destinado a apurar a
corrupção no país. Cogitou-se a abertura de IPM – Inquérito
Policial Militar para, após conhecida a extensão das responsabilidades
dos cem policiais investigados, a aplicação de
punições segundo as normas ditadas pelo Ato Institucional,
dirigidas aos inimigos do regime.
Os fatos causavam profunda tristeza e desconforto para
a maioria dos efetivos policiais, formados por profissionais
honestos que dedicavam as suas vidas à instituição e ao
cumprimento do dever. Para agravar, ocorrências envolvendo
propina associavam a polícia com a corrupção de funcionários
faltosos, quando os desvios não eram institucionais,
mas individuais.
O diretor da Divisão de Polícia Política e Social - DPPS,
entre os anos de 1964 e 65, era Cecil de Macedo Borer. Antes,
integrou o extinto quadro de inspetores de polícia política,
cargo em que exerceu por mais tempo as suas funções.
Como foi mostrado, essa investigação originou-se na DPPS,
órgão reconhecido por sua idoneidade.
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