A FUSÃO DOS DOIS ESTADOS
Fusão iniciou em 15 de março de 1975. A Polícia Civil do Estado da Guanabara era uma instituição que havia herdado do antigo Distrito Federal uma administração organizada, dotada dos recursos materiais necessários às suas atividades e com cerca de seis mil servidores, número este aproximado ao efetivo ideal. O ingresso dependia do concurso público para todos os cargos. A formação profissional, de curta duração, estava limitada ao aprendizado básico e prático. As polícias civis brasileiras não possuem a tradição do ensino policial europeu, com academias de polícia estruturadas para ministrarem cursos de formação longa, dois ou três anos, em regime de internato.
Quanto à Polícia Civil do Antigo Estado do Rio de Janeiro apresentava um estágio de desenvolvimento bem mais atrasado, compatível com a situação econômica do ente federativo. O efetivo não atingia os três mil servidores, nomeados independentemente de concurso público e distribuídos em reduzido número pelas dependências policiais. Passaram a recorrer aos funcionários requisitados e admitir (irregularmente) voluntários, para a formação das equipes das delegacias.
Segundo Francisco de Mello Franco, respeitado Secretário de Planejamento do Estado da Guanabara:
...naqueles últimos quatro anos, a Guanabara tinha sido o estado que mais se desenvolvera no país, o que estava em melhor situação financeira e orçamentária e o que tinha surpreendido mais, pelo arrojo de suas propostas; era uma joiazinha, com a maior renda per capita do Brasil e um nível cultural invejável. A essa cabeça, o governo federal decidiu juntar um corpo incompatível, mesmo historicamente C . . '). Acontece que fizeram a fusão e abandonaram o Rio de Janeiro, por isso não acredito que a razão tenha sido a criação de um segundo polo de desenvolvimento, como se chegou a dizer na época. Se fosse verdade, teriam repassado os recursos que prometeram (. .. ). Mas não fizeram nada disso. Com fundadas razões, acredito que a fusão teve como objetivo esvaziar o conteúdo oposicionista do Rio de Janeiro. (. .. ) Isso eu ouvi de mais de um militar, naquele tempo: "o Chagas a gente aguenta. Agora, quem é que vem depois dele?"
Com a Fusão, todos os funcionários efetivos foram aproveitados, tanto os do Quadro II, da antiga Guanabara, quanto os do Quadro III, do antigo Rio de Janeiro, mediante transposição para o Quadro I, no Novo Estado.
Tal fato muito beneficiou o pessoal do antigo Estado do Rio, cujos padrões de vencimentos eram bem inferiores. Prejudicou os demais, com vencimentos congelados até o término do governo da Fusão, em época de inflação.
Oficialmente, o processo durou durante o governo da Fusão, de 1975 a 1979. Na prática durou muitos anos. O maior desafio consistiu na tentativa de aproximar a administração atrasada do antigo Estado do Rio dos padrões da Guanabara.
A nova polícia recebeu um grupo de policiais do Quadro III em grande parte inadequados para as importantes funções. A depuração ocorreu na renovação propiciada pelas causas regulamentares de afastamento e substituição através dos concursos públicos realizados ao longo do tempo.
Sob o aspecto da adaptação e modernização dos serviços pouco se realizou em termos materiais. Realçam a construção de poucas delegacias regionais e a clássica aquisição de viaturas.
Não ocorreram protestos contra a Fusão. O servidor não protestaria durante um regime ditatorial. Aliás, nem na vigência do estado democrático de direito surgem protestos contra os nítidos propósitos de estagnação, desmancho, relativização da importância das Polícias Civis e da autoridade policial, conduzidos pelo MP e polícias militares, com a conivência dos governadores de estado.
A estagnação do efetivo da Polícia Civil do Rio de Janeiro em cerca de 9.000 servidores, desde 1975, evidencia tais propósitos. Provavelmente o mesmo ocorra em outros estados da Federação.
A falta de uma doutrina institucional desenvolvida em cursos de aperfeiçoamento e Altos Estudos, que as polícias civis não têm, talvez porque foram impedidas, e transmitida em sólidos cursos de formação profissional, que as polícias civis também não possuem, conduzem à alienação e à falsa crença da imutabilidade do artigo 144 da CF. e demais leis até agora vigentes.
Não houve melhoria para as categorias de funcionários. Os governos da ditadura, em nome da contenção de despesas, não proporcionaram melhorias para os servidores públicos.
No Rio, a partir da década de 80 elaborou-se um quadro para os servidores da Polícia Civil com um escalonamento vertical e níveis salariais correspondentes aos da Polícia Militar. Um grande erro, mas foi a orientação estabelecida por um general secretário de segurança. Diante da desesperadora defasagem salarial, as associações de servidores resolveram aceitar.
Nunca mais os padrões da administração policial do Estado da Guanabara foram totalmente recuperados para o novo estado. Foi um exemplo típico de divisão da pobreza e das suas consequências para todos os setores do atual Estado do Rio de Janeiro.
Na década de 80
A fase de redemocratização do país trouxe para o governo do Rio o engenheiro Leonel de Moura Brizola, oposicionista ao governo militar que terminava. Brizola procurou implementar uma política de irrestrito respeito aos direitos humanos na esfera da segurança pública. Embora fosse um intento louvável, descuidou de desenvolver e aplicar as ações de segurança pública requeridas da administração estadual sob o seu comando. Criou sérias restrições à ação da polícia nas áreas progressivamente controladas pelo tráfico de drogas, um equivocado aceno para a liberalização do crime com a repercussão negativa se propagando para todos os criminosos do estado.
Na esfera da administração policial, deixou de promover concursos públicos para a substituição de antigos policiais que se aposentavam, não proporcionou adequada formação para a atuação dentro dos preceitos implantados, descurou nos seus três últimos anos de mandato dos necessários reajustes salariais, não investiu na compra de equipamentos de segurança. Em suma, não valorizou o profissional da polícia e a instituição policial, enquanto implantava o novo modelo de segurança.
Foi relevante a extinção da Secretaria de Segurança e a consequente criação da Secretaria da Polícia Civil e da Secretaria da Polícia Militar. A coordenação de um Secretário de Segurança sempre foi de pouca efetividade e não substituiu o ordenamento policial conhecido e adotado para o trabalho conjunto e complementar dos dois segmentos, investigação e policiamento ostensivo, a partir do comando de cada circunscrição policial. Desnecessário se torna a criação de uma estrutura gigantesca e dispendiosa para coordenar simbolicamente duas corporações que não trabalham de forma colaborativa desde 1969.
A milícia prevista na legislação do alvorecer da República como apoio policial, passou a ser empregada pela ditadura militar com funções de polícia, independente e autônoma, subordinada ao governo do estado.
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